Kompassus rumo ao futuro

João Póvoa carrega consigo um legado familiar no mundo dos vinhos. Além das vinhas de família e de outras que foi comprando ao longo dos anos, o foco agora é a nova adega, ainda em fase de construção, que vai permitir a abertura ao Enoturismo. Os vinhos, da marca Kompassus, uma referência na região da Bairrada, complementam essa qualidade, da responsabilidade da enóloga Patrícia Santos.
É médico cirurgião oftalmologista em Coimbra, mas agricultor por paixão. As raízes familiares na vitivinicultura levaram-no a manter o legado familiar fazendo-o recordar momentos passados na vinha e na adega com o avô materno, o pai e a mãe.
O seu primeiro projecto como produtor engarrafador iniciou em 1991, na Quinta de Baixo, na Cordinhã, em terras que já eram de família e onde construiu uma adega que entretanto vendeu em 2007. Os seus dias, passados maioritariamente a dar consultas no Hospital de Coimbra, não lhe permitiam dar muito tempo à agricultura. No entanto, a paixão pelo vinho falou mais alto, acabando por regressar às lides vitivinícolas através da Kompassus, uma das grandes marcas de referência da região da Bairrada.
Para quem se interessa por estas temáticas, o nome da marca tem a ver com a prática de instalação de vinhas num compasso ou uma densidade de plantação mais apertada entrelinhas, e que ronda os 6000 pés/ha. Esta técnica resulta em corredores mais estreitos que distam entre si cerca 1.70 m. É uma prática antiga, desde sempre usada nas vinhas da Kompassus, mas actualmente em vias de extinção porque é dispendiosa. Mas as vantagens são muitas, como o aumento da qualidade das uvas, que ganham maior concentração de sabores e compostos aromáticos devido à competição entre as vinhas. Além disso, permite um melhor controle da produção, cria um microclima favorável ao amadurecimento das uvas e otimiza o uso do solo. E melhora, ainda, a resistência a doenças, e aumenta a eficiência na utilização da água tornando-a numa opção sustentável, especialmente quando voltada para vinhos de alta qualidade. Não são todos que trabalham assim.
Nas castas, a Baga é dominante nas suas plantações, sendo assim a base dos seus vinhos tintos e espumantes. Grande parte das uvas são provenientes de vinhas com mais de 70 anos, o que confere uma estrutura e profundidade de boca muito própria aos seus vinhos. Por isso, não é de estranhar que tenha ganho este reconhecimento e vários prémios ao longo dos anos. Mas, agora, o foco está também na construção de uma nova adega, também na Cordinhã, onde continuará a produzir vinhos e a receber visitantes. «A burocracia foi, desde o início, um dos maiores desafios. Envolve muitas licenças, aprovações e um percurso que pode ser desgastante, mas já fizemos vindimas aqui, a adega está a funcionar na parte produtiva. A parte do Enoturismo, está para breve, em breve teremos uma data a anunciar», explica o produtor. No entanto, isso não invalida que o entusiasmo esmoreça ou o trabalho pare: «Sempre acreditámos num espaço com identidade local que receba bem os visitantes. Estamos muito entusiasmados com o projecto e continuamos em frente», remata.


Na decoração da adega, João Póvoa irá utilizar mobiliário e antiguidades que foi adquirindo ao longo dos anos, ou que pertenciam à família, e que vão ajudar a contar a sua história. «A adega vai ter loja, um espaço de provas para receber os visitantes e uma sala mais pequena para quem quiser fazer algum almoço ou evento mais exclusivo», afirma. O design da adega, de linhas retas, integra-se na paisagem repleta de vinhas «A arquiteta Anabela Neto foi a principal responsável pelo projecto. Temos conjugado ideias para um projeto simples e direto, sem excentricidades», revela João Póvoa. «A decisão de manter um conceito minimalista foi estratégica. No local onde estamos, poderíamos fazer algo muito mais elaborado, mas os custos seriam elevadíssimos. No mundo do vinho, é difícil justificar esses investimentos».
No Enoturismo, a ideia é fazer visitas às vinhas e provas de vinhos, organizar almoços e jantares temáticos, workshops e até permitir que os visitantes sejam ‘enólogos por um dia’. Além da vertente vitivinícola, há a intenção de dinamizar culturalmente a região. Segundo o produtor, Cantanhede tem um dos melhores planaltos de vinhas da Bairrada, mas está subaproveitado. «O objetivo é mudar essa realidade, promovendo a região de forma mais abrangente e contínua», afirma. E é verdade. A oferta enoturística na Bairrada, ainda tímida, precisa de mais projetos bem estruturados. Embora alguns produtores locais já realizem algumas atividades, falta um plano consolidado que permita um desenvolvimento mais consistente do sector. Este é uma parte do espaço que João Póvoa pretende de certa forma ocupar, apostando numa experiência enoturística mais integrada e atractiva para todos.

Vinhos com identidade
Para Patrícia Santos, uma das enólogas mais reconhecidas (e enérgicas) do país, a preocupação com o meio ambiente e a valorização do terroir são pilares na Kompassus, que pretende sempre ver refletidos também nas experiências de enoturismo. «Desde o início, tivemos a preocupação de que o projeto estivesse alinhado com valores ambientais. Na adega, a intervenção é mínima, permitindo que o vinho se expresse de forma autêntica e fiel ao terroir. Queremos que os consumidores sintam que estão a adquirir um produto genuíno e responsável», afirma. O constante reconhecimento do mercado, fruto desta forma de trabalhar com dedicação e qualidade, é o maior incentivo para continuar. «Temos um património incrível e é um privilégio poder produzir vinhos desta qualidade. E através do Enoturismo poderemos fazê-lo ainda mais».
Dos vinhos provados no dia de visita à adega destacaram-se vários. O espumante Kompassus Grande Reserva rosé Brut Nature 2016 foi um deles, elaborado 100% com Pinot Noir, casta obrigatória em borbulhas de qualidade. O ‘segredo’ está na qualidade do vinho base e no terroir da Bairrada, elementos adicionados à boa prestação na adega da enóloga Patrícia Santos, grande apreciadora desta casta. Vindimada à mão, as uvas de Pinot Noir foram posteriormente prensadas suavemente a frio. A fermentação decorreu em inox com temperatura controlada. Produzido segundo o método clássico champanhês, estagiou sobre borras em garrafa e fez o Degorgement tal como ditam as regras. Em prova revelou fruta vermelha muito limpa e notas minerais, bolha fina e um paladar fresco, incisivo, cremoso, elegante e persistente.
Outro que se destacou na prova foi o Kompassus Alvarinho 2021, com um perfil muito particular ‘bairradino’, mais seco, salino e mineral, que nada tem a ver com o perfil dos vinhos Alvarinhos tradicionais que estamos habituados a provar da região de Monção e Melgaço. As vinhas de Alvarinho da Kompassus foram plantadas entre 2011 e 2012, tendo sido uma escolha estratégica no projeto, com um clone de alta qualidade que foi trazido especialmente para a região pelas mãos de Anselmo Mendes, amigo do produtor e o primeiro enólogo a dirigir o projecto (e também um dos grandes enólogos nacionais a trabalhar esta casta). Além da evidente qualidade de aroma e sabor, é um vinho que se revela também pela elegância e equilíbrio de boca.

A prova continuou com os tintos, onde se evidenciou o Kompassus Private Selection 2018, elaborado a partir de 100% Baga. Este é um dos vinhos especiais da gama Kompassus, proveniente de vinhas centenárias plantadas antes de 1930, possivelmente entre 1925 e 1927, sendo uma verdadeira relíquia da Bairrada. João Póvoa explica que a decisão de plantar exclusivamente Baga naquela época foi visionária por parte de quem a plantou já que, tradicionalmente, as vinhas antigas da região eram compostas por várias castas misturadas. O vinho impressiona pela sua personalidade e complexidade aromática, revelando frutos vermelhos envolventes, nuances balsâmicas e especiarias. Os taninos da Baga estão muito bem polidos, sustentando um corpo estruturado, profundo e elegantes, características que só as vinhas velhas sabem dar. No conjunto, destacam-se também as notas de madeira muito bem integradas, resultado da utilização de barricas de 600 litros com tosta média (em vez das tradicionais de 225 litros) conferindo ao vinho maior elegância e refinamento.
Outro que brilhou, agora um tinto, foi o Kompassus Private Selection 2018 , um vinho elaborado 100% com a casta Baga, que é um dos vinhos especiais da gamada Kompassus, sendo proveniente de vinhas centenárias de Baga, uma das castas mais emblemáticas da Bairrada. A vinha foi plantada antes de 1930, possivelmente entre 1925 e 1927, sendo uma verdadeira relíquia da região. João póvoa explica que a escolha de plantar e trabalhar com esta casta naquela época foi uma decisão visionária de quem a plantou, já que as vinhas antigas da Bairrada eram todas plantadas com castas misturadas. O vinho é realmente muito bom, com muita personalidade, complexidade aromática de frutos vermelhos envolventes, algum balsâmico e especiaria. Os taninos da Baga estão muito bem polidos, num corpo de vinho estruturado, profundo e elegante, que só as vinhas velhas sabem dar. O vinho também tem notas de madeira, muito bem integradas, tendo sido usadas barricas de 600 litros de tosta média, em vez das tradicionais de 225 litros, o que confere ao vinho uma maior elegância e refinamento.
Por fim, a estrela da prova, o tinto Gene 2019 (sem rótulo e ainda não lançado no mercado) – também proveniente de vinhas velhas – e que representa a homenagem de João Póvoa à sua família. O vinho, que provavelmente será lançado ainda este ano, é composto maioritariamente por Baga, mas também tem outras castas como a Touriga Nacional, Água Santa, Moreto de Cantanhede (quase extinta e que o produtor recuperou) e Bastardo. Todas elas são provenientes de vinhas velhas, com mais de 70 anos de idade. O vinho é de edição limitada e produzido apenas em anos de excelência. Dentro da gama de vinhos da Kompassus, este Gene encontra-se no topo da hierarquia e dá a conhecer um tinto estagiado em barrica, mineral, poderoso, de corpo denso, concentrado e profundo. Um vinho de grande complexidade e frescura, com madeira muito bem integrada. Um clássico bairradino no seu melhor.

