Mirabilis: A Caminho da Perfeição
São dez anos de Mirabilis, um vinho icónico da Quinta Nova de Nossa Senhora, apresentado numa prova didáctica e única conduzida pela produtora Luísa Amorim e a sua dupla de enologia e viticultura, Jorge Alves e Ana Mota.
Haverá vinhos perfeitos? Perfeitos não sei, mas equilibrados, de certeza. Aqueles que ao longo dos anos vão limando as arestas, tornando-se ainda mais delicados, elegantes, frescos e minerais. É assim a gama Mirabilis, que nasceu fruto da pesquisa de uma equipa que viajou e investigou o que melhor se fazia lá fora para aproveitar o que melhor de cá, adaptando ao que se podia fazer de melhor face à realidade portuguesa. As tendências da época ditaram as regras mas o perfil do vinho foi evoluindo ao longo dos anos, até atingir hoje uma maturidade que se revela através de vinhos impressionantes, onde tudo se conjuga entre si: a fruta, a estrutura, a frescura, a mineralidade e a madeira. Tudo no ponto certo.
Para celebrar os dez anos da primeira vindima de Mirabilis e nos mostrar o percurso realizado desde então, Luísa Amorim - a cara mais visível da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo - deu a provar algumas das melhores colheitas de Mirabilis elaboradas por uma equipa de luxo que todos os anos se esforça por fazer o melhor. Mas voltando ao início, à primeira colheita datada de 2011, o objectivo era bem claro: Luísa Amorim procurava produzir um vinho branco de grande nível, que na altura contribuiu para a visibilidade dos brancos durienses, e do país, a nível mundial. No ano seguinte, foi a vez de lançar o tinto, onde também se encontra grande frescura e elegância.
Para lançar estes vinhos, a produtora viajou com a sua equipa até França, onde visitou as principais regiões vitivinícolas, nomeadamente à Borgonha, para perceber e investigar como poderia fazer um grande vinho na Quinta Nova. A ideia era produzir vinhos raros e de enorme longevidade, vinhos irrepetíveis, e a «vontade de ir mais longe», segundo nos revela. Para desenhar a gama Mirabilis, foi então criado em 2010 um pequeno projeto – o Atelier do Vinho - que veio permitir à Quinta Nova tratar os vinhos como obras de estudo. Neste atelier, onde o cenário são os antigos lagares de granito da adega, original de 1764, foram colocados diferentes balseiros em madeira e cubas de inox, num total de 17.800Lt, para desenvolver pequenas vinificações de parcelas e sub-parcelas da quinta e ensaiar diferentes sistemas de maceração e maturação. Tudo feito sob um rigoroso controlo, desde a seleção das uvas à sua receção e vinificação. Ao compararmos a primeira colheita de 2011 com a de 2021 apercebemo-nos da dita evolução, e através da prova vertical, da sua evolução até à maturidade. A estrutura e a madeira são mais evidentes nas primeiras colheitas e vão-se tornando mais elegantes com o passar dos anos, como aconteceu, aliás, com a generalidade dos vinhos em Portugal e no mundo. É uma tendência natural que descobre um equilíbrio que conquista os enófilos de paladar apurado desde o primeiro gole de vinho.
Ladeada pela equipa que a acompanha desde o início, Ana Mota (na viticultura); e Jorge Alves (na enologia), Luísa deu finalmente a conhecer, numa prova vertical única, os Mirabilis brancos (2012, 2014, 2016, 2018 e 2019) e os Tintos (2013, 2018 e 2019), que representaram os melhores entre os melhores. Os MIRABILIS Brancos são elaborados com uvas de pequenas vinhas centenárias onde predominam o Viosinho e o Gouveio, mas também variadíssimas outras castas de escassa produção, já quase inexistentes na região. Cachos pequenos, apertados e bagos singelos, fazem com que a produção por hectare não vá além dos 2300 kg, em solos de altitude superior a 500 metros, geologicamente classificados como solos de transição xisto/granítico, nas freguesias de Vilar de Maçada, Cabeda, Tabuaço e Candedo. Algo que confere aos mostos uma genuinidade sublime, onde frescura e aroma se acentuam naturalmente. A madeira selecionada é propositadamente de segundo e terceiro ano, apenas uma pequena percentagem de madeira nova, para não marcar e melhor integrar lentamente a fruta intensa, incidindo sobretudo no carvalho francês e húngaro, resultando num vinho de extrema elegância, onde a frescura, estrutura e acidez se entrelaçam.
Já o Mirabilis tinto é inspirado na linha dos grandes vinhos do mundo. As uvas são colhidas manualmente nas melhores parcelas e vinificadas, dando origem a vinhos de grande qualidade. De ano para ano, é um vinho irrepetível, não copiável, com uma composição heterogénea de pequenas quantidades, poucos litros de cada uma das melhores barricas, até chegar ao resultado final: um vinho denso, intenso de aromas, com uma profundidade e mineralidade inigualáveis, muito elegante e persistente e com grande potencial de envelhecimento.
Recorde-se que a Quinta Nova situa-se na sub-região do Cima Corgo e tem 120 hectares que abraçam a margem direita do rio Douro – tradicionalmente mais solarenga e também mais valorizada – ao longo de 1,5 km, com uma mancha única de 85 hectares de vinha enquadrada no património mundial da UNESCO. Referenciada desde a primeira demarcação pombalina, em 1756, esta é uma quinta secular detentora de um terroir especial. Propriedade da Casa Real Portuguesa até 1725, tornou-se uma ‘quinta nova’ pela junção de duas quintas numa só. Durante os séculos XVIII e XIX, viveram aqui várias famílias portuguesas que deram vida à vinha e ao vinho, aos pomares de fruta (que, vedados por muros altos, eram uma das riquezas da propriedade, ainda hoje harmoniosamente enquadrados nos patamares de vinhas), à azenha junto ao antigo olival e à ribeira que atravessa a quinta, numa época importante na agricultura de subsistência do Douro. Data também de 1764 a adega, uma das mais antigas do Douro, um conjunto de edifícios tradicionais com largas portas de madeira por onde, no passado, passavam as pipas de vinho do porto para os carros de bois. Logo ao lado, a casa senhorial oitocentista (que hoje dá lugar à Winery House da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo) com a capela (1765), onde ainda se realizam as missas da vindima.
Lá em baixo, junto ao rio, foi erguida no século XVII uma outra capela para proteger os homens que se aventuravam nos barcos rabelos num trecho particularmente traiçoeiro do rio. Durante a viagem, quando a travessia não corria bem ou a morte lhes parecia próxima, faziam promessas à santa padroeira em troca de salvação e a seu pedido foi feita uma imagem em pedra de granito da Nossa Senhora do Carmo, com o escapulário da Ordem das Carmelitas.