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Quinta de Ventozelo: Dez Anos de Transformação 

Em 2024, a Quinta de Ventozelo comemora uma década sob a gestão do grupo Granvinhos, marcado por um período de profunda transformação que a posicionou como uma das quintas mais emblemáticas do Douro. Com um investimento total de 15 milhões de euros, distribuídos entre turismo e ambiente, Ventozelo tornou-se num modelo de sustentabilidade, enoturismo e preservação ambiental, afirmando-se no cenário vitivinícola e (eno)turístico português.

Desde a sua aquisição, em 2014, a Granvinhos iniciou um ambicioso projeto de recuperação e valorização da Quinta de Ventozelo. Foram recuperados 16 edifícios, respeitando a arquitetura tradicional, e reabilitados 40 hectares de vinha, dos 200 hectares actualmente em produção.

O resultado deste esforço é expressivo: Ventozelo produz agora cerca de 750.000 litros de vinho por ano, dos quais 500.000 são dedicados ao vinho do Porto, e 250.000 aos vinhos DOC Douro, num total de 28 referências lançadas no mercado nos últimos dez anos. Além disso, a Quinta produz anualmente 5.000 litros de azeite, contribuindo para a diversidade da sua vocação agrícola. «O desafio foi gigantesco, sobretudo pela dimensão da propriedade. Tivemos de reestruturar 40 hectares de vinha (20% do total de vinha), seja porque havia castas estrangeiras que não faziam sentido, seja porque havia parcelas praticamente abandonadas. Tivemos também a preocupação de salvaguardar as áreas de vegetação natural para refúgio da fauna e proteção da paisagem e dos solos, naquilo que modernamente se designa por uma gestão de base natural. Mas o maior desafio foi, sem dúvida, recuperar todo o património construído - 16 edificações -, respeitando a matriz original. Felizmente pudemos reunir uma equipa pluridisciplinar muito competente, que interiorizou o conceito que queríamos imprimir ao projecto. Numa palavra, autenticidade» afirma Jorge Dias, administrador da GranVinhos.

Em 2019, Ventozelo deu um passo em frente na diversificação da sua oferta com a inauguração do Ventozelo Hotel & Quinta. Com 29 quartos distribuídos por sete edifícios recuperados, o hotel rapidamente tornou-se num destino de eleição, contabilizando mais de 25.000 hóspedes desde a sua abertura. Quem visita a propriedade pode usufruir de um conjunto de atividades que incluem provas de vinhos, percursos pedestres e visitas ao Centro Interpretativo de Ventozelo, que já acolheu mais de 16.000 visitantes. A Cantina de Ventozelo, um restaurante farm-to-table, destaca-se pela utilização de produtos biológicos cultivados nas hortas da quinta e pela aposta numa gastronomia autêntica e sustentável.

A propriedade diversificou a sua oferta com a inauguração do Ventozelo Hotel & Quinta
O hotel é uma referência e já contabiliza mais de 25.000 hóspedes desde a sua abertura
O hotel tem 29 quartos distribuídos por sete edifícios recuperados
A Cantina de Ventozelo, um restaurante farm-to-table, utiliza produtos biológicos e aposta numa gastronomia autêntica e sustentável.



Um dos pilares da intervenção em Ventozelo foi também a sustentabilidade. Em 2021, formalizado um plano de gestão dos ecossistemas, biodiversidade e agroecologia da Quinta, evidenciou-se o compromisso com a proteção do ambiente e a promoção da biodiversidade. Este plano orienta todas as práticas agrícolas e ambientais na propriedade, e resultou na identificação de 224 espécies de flora, das quais mais de 20% são classificadas como RELAPE (Raras, Endémicas, Localizadas, Ameaçadas ou Protegidas), e 185 espécies de fauna, incluindo algumas em risco de extinção.

O desafio da equipa de viticultura e de enologia, constituída por Pedro Pina Cabral e José Mesquita e liderada por José Manuel Sousa Soares, é compreender a diversidade geológica dos solos, microclimas, castas e sistemas de condução, adaptar as melhores práticas vitícolas de modo a obter vinhos com identidade própria, elegantes e frescos que reproduzam a diversidade do Douro e a(s) verdadeira(s) natureza(s) de Ventozelo.

A gestão sustentável das vinhas, com práticas como a redução de herbicidas em mais de 30% e o uso de coberturas vegetais naturais, reflete a preocupação com a preservação do solo e dos recursos hídricos, contribuindo para a neutralidade carbónica da quinta. Este foco na agroecologia e na gestão responsável dos recursos naturais tem garantido a qualidade e autenticidade dos produtos de Ventozelo e reforçado o seu papel como guardiã de um importante património ambiental.

No âmbito da responsabilidade social e cultural, Ventozelo também marcou a diferença. Em 2021 foi reactivada a ‘Associação Amigos de Ventozelo’, com a apresentação de um projeto cultural que visa contribuir para a estratégia de desenvolvimento do Douro – Artes & Ideias em Ventozelo. O projecto consistiu num conjunto de seis exposições de artistas plásticos que se propuseram olhar o Douro, e de seis Conversas em Ventozelo que foram editadas mais tarde pela imprensa (jornal Público). Neste âmbito debateram-se as questões que limitam o desenvolvimento do Douro, num exercício de cidadania, de responsabilidade social e interesse público, com um olhar para o futuro colectivo, numa perspectiva social, económica e ambientalmente sustentável.

Apesar do que já foi feito, Jorge Dias afirma que numa propriedade desta dimensão «há sempre algo para fazer, seja na vinha e outras culturas, seja nos espaços naturais, seja no património construído. Mas, sobretudo, ao nível do serviço e da oferta de experiências aos visitantes, há sempre margem de melhoria, de modo a tocar indelevelmente quem visita Ventozelo». E ainda destapa o véu com uma novidade: «Estamos agora a ponderar a construção de um pequeno núcleo de casas nas árvores (duas ou três), na mata e junto ao rio, de proporcionar aos nossos visitantes outro tipo de experiência num habitat natural».

Recorde-se que a primeira referência documental a Ventozelo aparece nas inquirições de 1288, no reinado de D. Dinis, apontando-a como aldeia, associada à de Roriz. Contudo, apenas no século XVI, cerca de 1500, por emprazamento ao mosteiro de S. Pedro das Águias, a Quinta de Ventozelo entrou na posse dos fidalgos da Casa do Poço, de Lamego, havendo títulos sucessivos de emprazamentos de 1680 e 1740 e 1806. Ao longo dos séculos XVI a XVIII, o investimento vinhateiro foi diminuto e a quinta era sobretudo utilizada como coutada de caça a par do aproveitamento extensivo de olivais, terra de pão e sumagre. Nos finais do século XVIII, com a expansão das exportações de vinho do Porto, a Quinta de Ventozelo, com os seus três núcleos principais – Ventozelo Velho, Ventozelo Novo e Quinta Nova -, conhece um período de prosperidade, destacando-se pela qualidade dos seus vinhos. No século XIX, a Filoxera que afectou as vinhas mundiais, abrandou o seu sucesso económico, mas a quinta foi ultrapassando todos os problemas e seguindo o seu caminho. A grandeza da sua história é inequívoca, no entanto, a última década representa um capítulo muito importante nas áreas da inovação e preservação, que em muito contribuíram para o seu desenvolvimento e sucesso económico.

Hoje, a GranVinhos é um dos principais produtores de vinho do Douro, afirmando-se também no campo da biodiversidade e como destino de excelência. Uma propriedade histórica gerida com sensibilidade, brio e bom senso, revitalizada e adaptada às exigências modernas, o que lhe permitiu manter a sua identidade. Um lugar onde o respeito pelo passado se alia a uma visão sustentável para o futuro. «Ventozelo é um sítio mágico, onde ainda é possível desfrutar de simples momentos, como ver as estrelas e ouvir o silêncio: o bastante para sermos felizes!», remata Jorge Dias.