Um caso sério
O novo Casa da Passarella Vindima 2009 homenageia um trabalho de gerações que trabalharam na vinha e destaca a enologia aprimorada que se tem praticado ao longo da última década nesta propriedade do Dão.
Conhecido pelo seu trabalho de investigação e de experimentação, e de respeito pelas tradições, o enólogo Paulo Nunes elaborou um vinho – o tinto Casa da Passarella Vindima 2009 – que revela o património vitícola da propriedade com o mesmo nome, situada em Lagarinhos, no Dão. Um vinho que, segundo o enólogo «expressa o ADN desta casa com 130 anos», afirma, acrescentando que «o trabalho feito nos últimos 12 anos está refletido neste Vindima 2009 que agora chega ao mercado».
O património vitícola da Casa da Passarella está, assim, no epicentro do conceito do vinho. «Os mapas de vinhas da Casa da Passarella dos anos 1930 e 1940 indicam que houve vinhas que estavam a ser plantadas e outras abandonadas, de uma forma deliberada» , conta o enólogo, reconhecendo que a grande mais-valia desta casa passa pela vinha: «É um legado construído ao longo de mais de um século. São vinhas que resultam da lei do uso e do desuso, de um processo dinâmico e longo de seleção por tentativa e erro», explica.
A razão pela qual Paulo Nunes esperou mais de uma década foi, de certo modo, para revelar também a região onde ele nasce, o Dão, terra de vinhos tradicionalmente longevos, ou seja, com grande capacidade de envelhecimento. «São vinhos de uma enorme dimensão, com um peso esmagador. Quando falo de vinhas velhas costumo dizer que não tenho tempo de vida suficiente para a ter conhecido a fundo, para a testar atá ao limite máximo, visto que são vinhas com mais de 70, 80 anos. Não a pude acompanhar ao longo do seu ciclo de vida mas houve todo um trabalho que foi feito e nós temos esse legado que agora temos o privilégio de continuar», diz o enólogo.
Para Paulo Nunes, o factor tempo é decisivo, por isso, só no final do estágio é que sabe se haverá uma nova colheita a ser lançada. O que significa que haverá vindimas sem edição deste Casa da Passarella. «O vinho tem de estar lá, no seu ponto de equilibrio máximo, senão, não vale a pena lançar», explica, revelando ainda que este primeiro Casa da Passarella Vindima tem uma parcela matriz mas, futuramente, pode não ser desta parcela mas de outras. A decisão é tomada na adega, numa fase precoce, quando os diferentes vinhos estão prontos para ir para estágio em barrica. «Percebemos o potencial de cada fermentação em separado e escolhemos para o lote aqueles que possam ser, para aquele ano, a maior identidade possível da Casa da Passarella».
O processo de vinificação é o de sempre, tradicionalmente em lagar de granito e estágio inicial em barricas usadas de 600 litros. «Não houve na criação do novo Vindima 2009 qualquer tipo de intervenção moderna. Quando um enólogo chega a uma casa com 130 anos de história, o mais sensato é começar por aprender. Somos apenas uma peça do dominó e estamos de passagem. Se contribuirmos para perpetuar este património cumprimos o nosso papel», conclui.
Este vinho, diz quem vos escreve, é um dos melhores tintos do Dão que provei ultimamente. Uma obra de arte da natureza aliada à sabedoria do enólogo. Estão lá os frutos vermelhos, a especiaria e o balsâmico no aroma tão característico dos vinhos da região, complementado por bonitos aromas terciários (de envelhecimento). No paladar é um tinto aveludado e envolvente, de fina complexidade e frescura. Está lá a enorme elegância que a região sempre deu aos grandes clássicos do Dão. É composto por Jaen, Touriga Nacional, Alvarelhão, entre outras, de uma parcela com mais de 80 anos. O vinho estagiou 18 meses em barricas usadas e foram enchidas cerca de 3000 garrafas que já estão no mercado pelo PVP de 195€. Pode ser encontrado em garrafeiras e restaurantes de referência.
Vinhos especiais, vinhas igualmente especiais
Durante a apresentação do Vindima 2009 foram ainda apresentados outros vinhos da Casa da Passarella, com outros perfis mas também de grande qualidade. O Villa Oliveira Encruzado 2017 é produzido desde 2011 segundo a tradição da casa, com curtimenta e fermentação iniciada juntamente com a película. Depois é prensado ao segundo dia de fermentação, altura em que inicia estágio em barricas de 600 litros, onde permanece por um ano, fazendo fermentação maloláctica parcial. Lançado com três ou quatro anos de idade, este branco procura ser um vinho diferenciador dos restantes Encruzados do mercado, através da sua complexidade de aromas (primários, secundários e terciários).
O Villa Oliveira Segunda Edição 2015 a 2019, é a segunda edição de um lote de cinco vindimas na Casa da Passarella da casta Encruzado (de 2015 a 2019). Em cada ano é deixada uma barrica de Encruzado, resultando, ao final de cinco anos, uma nova edição deste blend da casta emblemática do Dão. Este vinho de cinco vindimas de Encruzado pretende mostrar que o conjunto pode ser melhor do que a individualidade. E, ao contrário do que poderia ser espectável, o tempo prolongado em barrica não deixou o vinho marcado, facto que motivou, aliás, um artigo científico do enólogo Paulo Nunes.
Estes vinhos são provenientes de vinhas especiais. A propriedade é composta por sete vinhas localizadas em terrenos graníticos ligeiramente acidentados e a uma altitude entre os 500 e os 800 metros, com exposições a norte e a sul, e de diferentes idades (algumas centenárias), totalizando 60 hectares. O estudo da vinha e a prática de uma viticultura sustentável é um traço marcante da Casa da Passsarella. A vinha não tem rega, nem mesmo em vinhas novas, para uma seleção natural das cepas mais resistentes, os adubos verdes são a flora autóctone e manuseio do solo tem em conta o ciclo da natureza - para reter água no inverno e proteger da evaporação no verão. Com um portefólio diversificado, 26 referências no total, a Casa da Passarella continuará a apresentar coleções de vinhos que reflectem este lugar tão especial que é a região do Dão e o lugar da Passarella.
Fotos: Paulo Pereira